Do papa e outros papos
02 agosto 2013 |
O primeiro papa do qual me lembro muito bem foi Eugênio Pacelli, entronizado como Pio XII, em 1939, e que morreu em 1958. Seu papado cobriu, portanto, parte da minha infância até a idade adulta. Foi reverenciado, como muitos outros. Minha mãe, por exemplo, fazia o sinal da cruz quando falava nos papas. Não só ela, mas todos os católicos praticantes, como são chamados, até hoje, os que vão à missa, confessam, comungam, jejuam e seguem os Dez Mandamentos da lei de Deus.
Nunca me incluí nesse contingente, apesar dos quatro anos que vivi num internato de padres espanhóis, sem contar os tempos de coroinha e congregado mariano. Fui sempre um católico da boca para fora, chegando a dormir de roncar em algumas missas, omitindo pecados no confessionário, pecando contra a castidade. E uma vez mastiguei uma hóstia consagrada. Enfim: fui sempre um capeta que o tempo serenou.
Com a vinda ao Brasil do papa Francisco, por causa de seu carisma e simpatia, os papos religiosos voltaram às mesas familiares e às rodas de amigos, com muita gente se dando conta, pela primeira vez, da existência de uma autoridade de grande poder.
— Ele lidera mais de 2 bilhões de pessoas em todo o mundo!
O comentário exclamativo era de um amigo que gostava de proclamar sua descrença religiosa. Eu só ouvia, sem saber se a informação era ou não correta. Mas um outro frequentador do círculo, um que nunca escondeu sua religiosidade, perguntava com ironia:
— Tá sabendo disso hoje?
— Tinha ouvido falar, li qualquer coisa, mas a fonte era sempre a Igreja Católica. E essa não é minha praia. Mas agora, com pesquisas oficiais e insuspeitas, confesso minha surpresa.
Alguém minimizou a grandeza da informação:
— Essa gente toda, 2 bilhões ou até mais, não congrega só católicos praticantes, mas toda e qualquer pessoa que se diz católica. Como a maioria.
— Mesmo assim. Se alguém se diz católico, está dizendo que não é protestante, nem budista, nem espírita.
O papo mudou de rumo:
— Espiritismo não é religião, é uma doutrina baseada na crença de que vivos e mortos se comunicam.
— Mas, já que você gosta tanto de pesquisa, fique sabendo que existem no mundo quase 20 milhões de espíritas.
E essa espécie de competição religiosa se alongou por quase toda a tarde. Quando saí do Severino, eles lá ficaram, abrindo uma segunda garrafa de vinho e sacando de vários argumentos que favoreciam uma ou outra religião.
Chegando em casa, pensei em consultar o Google, colher informações confiáveis etc., mas minha mulher, com seu bom-senso e sua objetividade, me fez desistir dessa busca:
— Para que vai se dar a esse trabalho? Religião é um tema inesgotável e não conclusivo porque se baseia na fé, e não em evidências.
Pensei no verso de Fernando Pessoa, que já citei aqui: “Nada se sabe, tudo se imagina”. Minha mulher completou:
— E fé é ausência de perguntas.
E emendou:
— Agora vamos jantar. Mandei fazer seu prato predileto.
E vieram as panquecas, que consumi com fervor quase religioso.
Nunca me incluí nesse contingente, apesar dos quatro anos que vivi num internato de padres espanhóis, sem contar os tempos de coroinha e congregado mariano. Fui sempre um católico da boca para fora, chegando a dormir de roncar em algumas missas, omitindo pecados no confessionário, pecando contra a castidade. E uma vez mastiguei uma hóstia consagrada. Enfim: fui sempre um capeta que o tempo serenou.
Com a vinda ao Brasil do papa Francisco, por causa de seu carisma e simpatia, os papos religiosos voltaram às mesas familiares e às rodas de amigos, com muita gente se dando conta, pela primeira vez, da existência de uma autoridade de grande poder.
— Ele lidera mais de 2 bilhões de pessoas em todo o mundo!
O comentário exclamativo era de um amigo que gostava de proclamar sua descrença religiosa. Eu só ouvia, sem saber se a informação era ou não correta. Mas um outro frequentador do círculo, um que nunca escondeu sua religiosidade, perguntava com ironia:
— Tá sabendo disso hoje?
— Tinha ouvido falar, li qualquer coisa, mas a fonte era sempre a Igreja Católica. E essa não é minha praia. Mas agora, com pesquisas oficiais e insuspeitas, confesso minha surpresa.
Alguém minimizou a grandeza da informação:
— Essa gente toda, 2 bilhões ou até mais, não congrega só católicos praticantes, mas toda e qualquer pessoa que se diz católica. Como a maioria.
— Mesmo assim. Se alguém se diz católico, está dizendo que não é protestante, nem budista, nem espírita.
O papo mudou de rumo:
— Espiritismo não é religião, é uma doutrina baseada na crença de que vivos e mortos se comunicam.
— Mas, já que você gosta tanto de pesquisa, fique sabendo que existem no mundo quase 20 milhões de espíritas.
E essa espécie de competição religiosa se alongou por quase toda a tarde. Quando saí do Severino, eles lá ficaram, abrindo uma segunda garrafa de vinho e sacando de vários argumentos que favoreciam uma ou outra religião.
Chegando em casa, pensei em consultar o Google, colher informações confiáveis etc., mas minha mulher, com seu bom-senso e sua objetividade, me fez desistir dessa busca:
— Para que vai se dar a esse trabalho? Religião é um tema inesgotável e não conclusivo porque se baseia na fé, e não em evidências.
Pensei no verso de Fernando Pessoa, que já citei aqui: “Nada se sabe, tudo se imagina”. Minha mulher completou:
— E fé é ausência de perguntas.
E emendou:
— Agora vamos jantar. Mandei fazer seu prato predileto.
E vieram as panquecas, que consumi com fervor quase religioso.
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